23 de set. de 2015

MÚSICA | Entrevista com Duda Brack


Eba, mais uma entrevista no Perdi A Chave! Okay, essa é uma entrevista antiga que realizei para um outro portal mas agora, com disco lançado, vale muito a pena relembrar. 

A conversa foi com a cantora Duda Brack. Uma jovem de vinte anos que já carrega em sua trajetória premiações e admiradores assíduos que, mais do que ouvir, degustam, saboreiam e se lambuzam com sua voz. Extremamente simpática, aceitou responder algumas perguntas dessa blogueira (e fã) impertinente que vos fala. Confira abaixo essa entrevista e ouça o álbum "É" completo.




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Eu: Que sua voz é notavelmente linda, até os ouvidos mais dispersos conseguem perceber, quero saber como foi o inicio de sua carreira. Em qual momento veio à sua mente “eu sou cantora”?

Duda: Sempre digo que sou a vontade de cantar, e não a cantora. Nunca me percebi cantora. Percebi a necessidade, o impulso de cantar, quando eu fiz quinze anos. Não cantava antes - só no chuveiro. Tampouco tinha qualquer tipo de relação estreita com música, mas comecei a me experimentar. Cantei em bares, em grupos vocais, ouvi muita música, convivi com artistas. Mergulhei fundo numa busca de me entender nesse mundo e compreender o que eu queria fazer com isso. Foi um ʻafloramentoʼ. Não nasci cantora, de cimento, de barro, me fiz e me faço cantora no ato (porque amar é agir!).

Eu: É muito nova ainda – 20 anos de idade, uma menina – e o mais notável em sua música é a interpretação e as letras que são, na sua maioria, pesadas, dotadas de uma melancolia onde o ouvinte consegue senti-la em sua voz. Há alguma vivência ou inspiração que utilize para chegar ao resultado final de suas músicas? Tem algum apego ao escolher qual irá interpretar?

Duda: Acredito que toda vivência é a inspiração, e mais, a matéria prima desse resultado final, consciente ou inconscientemente. A gente externa aquilo que nos atravessa, que nos perfura. Estar vivo é estar exposto à todos esses estímulos. Por isso a escolha do repertório é tão substancial e emblemática na construção do trabalho de um intérprete. A gente escolhe cantar o que a gente queria dizer e não consegue. É um ʻdesafogamentoʼ. Sou muito minuciosa e cheia de apegos pra escolher o que vou cantar. São várias instâncias de apego: busco a melodia que me cabe na voz, busco a mensagem que eu quero sustentar, busco uma subversão dos caminhos óbvios, busco algo que meu corpo possa cantar junto, busco sentir que a música precisa de mim tanto quanto eu preciso dela (tipo varinha do Harry Potter, que escolhe o bruxo, sabe? rs), mas tudo é isso é secundário. O que de fato determina é o quanto aquilo tudo, no conjunto da obra, me é absoluta e incontrolavelmente visceral, e aí os porquês não tem mais a menor importância. É totalmente passional.

Eu: Sei que é uma pergunta difícil, cada artista sente uma sensação única no palco. Mas e você? Como se sente?

Duda: Palco é: ʻeterutopiaʼ; parir sentidos; oxigenar a vida; ode ao abismo; mover o dom; esbugalhar entranhas; ferir o são; romper toda possibilidade de impossibilidade; sedução; dançabilidade; amar sem calcular; livrar-me da loucura de minha própria criação; cuspir a alma pela boca; trepar curiosidades de belezas acesas; sustentar as purezas sujas; quebrantar-se; quebrar-se; brandar-se; brindar; desvelar o sagrado segredo de tocar o intocável intocado pra morrer na boca de um orgasmo.

Eu: Quais são suas principais influências na música?

Duda: Aí é difícil. São tantas! Tem o leite materno - coisas que ajudaram a construir meu primeiro pensamento musical, como: Tom Jobim, Djavan, Maria Gadú, Elis Regina, Ella Fitzgerald, Gil, etc. Mas, nesse momento da vida: Fiona Apple, Caetano Veloso, Gal, Lenine, Ana Cañas, Ney Matogrosso, RadioHead, LedZepplin, Vitor Ramil, Bjork, Jeff Buckley, Chico Cesar, Moska, The Dead Wheather, Pink Floyd, Stones e, sobretudo, contemporâneos meus (falo mais sobre eles na próxima pergunta).


Eu: Atualmente, devido a programas de financiamento coletivo e encontros musicais, muitos músicos estão se unindo de diferentes pontos do país para mostrar sua arte (cito como exemplo a cooperação para o “Na vida anterior” de João Guarizo que contou com muitos artistas no Catarse). Como você vê essa nova geração da MPB e toda essa interação que atualmente se expande cada vez mais?


Duda: Acho isso tudo a coisa mais maravilhosa do mundo. Essa interação expande galáxias no trabalho de todo jovem artista hoje. Música é troca, é comunicação, é comunhão. Quanto mais essa interação for ativada, tanto mais cresceremos, e isso não só em relação à construção musical e artística mas também no que tange a disseminação destes novos trabalhos e formação de público. Voto que cada vez mais as vidraças da individualidade sejam rompidas, pra que a gente viva cada vez mais e mais essa ʻsurubaʼ musical . Mais do que uma nova geração de MPB emergindo, me atento e me atenho a comentar sobre trabalhos de contemporâneos meus que tem, a meu ver, contribuído para o desenvolvimento de uma linguagem universal da música: RUA, Posada e o Clã, Baleia, Ventre, Cícero, Paulo Monarco, Caio Prado, Cesar Lacerda, João Cavalcanti, Phill Veras, os meninos do 5 a Seco todos, Dani Black, Lucas Vasconcelos, Bruna Moras, Julia Vargas, Pietá, Thales Silva, e tantos e tantos e tantos outros, que tem todo o meu respeito e admiração. Uns mais conservadores, sustentando a tradição de nossa música. Outros mais ousados, que subvertem os caminhos óbvios e propõe um ineditismo maior (esses tem minha reverência, porque são parte de minha busca).

Eu: Como você vê a importância da internet em sua carreira e esse cenário musical que nasce e se expande por intermédio da web? Já conheceu cantores ou fez parcerias musicais por intermédio da mesma?

Duda: E tem como não achar maravilhoso? Em tempos de reformatação do mercado fonográfico e midiático a internet é o que mantém acesa a fagulha da possibilidade de realização. A internet é de uma importância substancial, pois é o que permite que nosso trabalho exista no mundo, para além do nosso controle e poder de alcance.Já conheci vários cantores e compositores por meio da internet e estabeleço várias trocas.

Eu: Falando em interação, o Because Ousa nasceu de um encontro entre outros grandes jovens músicos. Qual sua relação com essa música e como foi pra você defende-la e vencer no Festival de Música de Sorocaba?

Duda: ʻBecause Ousaʼ foi um divisor de águas no meu caminho musical e na minha vida; foi paixão à primeira ouvida, e foi arrebatador. Ela foi o meu primeiro movimento, na construção de um trabalho autoral. Me parece que ali emergiu algo que, para o público que recebia, apontava, sublinhava quem era a Duda. Ali acho que as pessoas começaram a se atentar para o que eu tinha a dizer. Fizemos 8 festivais com ela e fomos premiados em todos. Gravamos ela no projeto ʻMúsica de Graçaʼ da Dani Gurgel. Ela me rendeu experiências maravilhosas que me possibilitaram entender mais do meu ofício (física e espiritualmente); ela me fez amadurecer e me descobrir mais; ela me abriu portas para várias outras trocas; ela conquistou um pequeno (mas absolutamente significativo!) público com quem eu estabeleço hoje uma troca. 


Eu: Soube que em breve seu filho irá nascer – o seu primeiro CD – o que podemos esperar dele? Fale-nos mais sobre esse projeto.

Duda: Trata-se de um trabalho autoral, sobre ineditismos de compositores contemporâneos meus, os quais foram escolhidos à dedo, não só pelo meu interesse artístico de interseccionar cada um desses universos com o meu trabalho, mas também por questões afetivas (de trocas que já vinham se estabelecendo há um tempo). É um disco de banda - que reflete o meu encontro com os três músicos e com o produtor do disco; é uma construção coletiva; é o NOSSO disco. Muito amor, admiração e gratidão por todos os envolvidos. É um disco subversivo, que sustenta a tradição da canção, mas desconstrói o modo com o qual ela é abordada, explorando novas sonoridades. É um disco troncho e sedutor. Fala sobre coragem, sobre paixão, sobre abismo, sobre dor, sobre certezas e incertezas, sobre sonho e sobre fé. É um retrato de quem eu sou agora, do que me atravessa, do que inquieta, me integra, e é o mel do meu melhor. Quanto ao que vocês podem esperar dele: acho complicado responder isso. Me pego pensando que gostaria que vocês não esperassem nada, rs. Gostaria que vocês simplesmente o recebessem com uma escuta corporal e sensorial aberta às novas possibilidades que proponho ali. A única garantia que posso dar é de que foi feito com todo amor que já fui capaz de abrigar nessa vida. Muito amor, com todas as formas, de todos os jeitos em todos os gestos.

Eu: E falando em futuro, já tem em mente aonde quer chegar? Quais são os seus sonhos nesses caminhos musicais?

Duda: Sou muito grata à Deus, à vida, por tudo que tem me acontecido desde que eu comecei a fazer música, e sobretudo sou grata ao modo como tudo isso tem sido construído - com solidez, entrega, trabalho, dignidade, com lindas descobertas, com pessoas incríveis fazendo parte dessa construção. Acho que o que eu mais desejo é seguir desfrutando dessa plenitude e expandindo-a a cada conquista. Desejo cada vez mais poder conviver, trabalhar e trocar com pessoas maravilhosas e que eu admire. Desejo cada vez mais descobrir a ʻinfinitudeʼ de possibilidades que a música é. Desejo me descobrir, cada vez mais. Desejo crescer, aprender, melhorar, contribuir, agregar, e dar algum sentido (pra mim e pro mundo) à minha existência.


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O tempo passo e cá está o filho nascido, forte, profundo, lindo! Boa degustação a todos! 





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